Antes de mais, devo dizer que sou consultora imobiliária, traduzindo este texto a minha opinião pessoal e não em representação de qualquer marca, empresa ou com qualquer intuito que não seja a mera expressão da minha própria reflexão sobre este tema.
A crise de 2008 trouxe uma dinâmica ao mercado imobiliário até então pouco vista. Se por um lado muitos portugueses optaram por criar o seu próprio emprego através da reabilitação de casas de pequena dimensão, em zonas históricas de Lisboa, para Alojamento Local, outros tantos perceberam a oportunidade de valorização no curto prazo e fizeram o seu investimento. Ao mesmo tempo, estrangeiros eram “aliciados” a investir em Portugal, quer por razões fiscais (Franceses por exemplo) quer pelos Vistos Gold (para os não europeus).
Nos decorrer destes anos, Lisboa entra na moda e Portugal passa a ser um destino de eleição. Se o Algarve já o era para os ingleses, Lisboa apresenta-se como uma capital europeia com preços por m2 muito competitivos, num país cheio de sol, à beira mar plantado, com praias convidativas, comida deliciosa e segurança elevada. E quem diz Lisboa, diz Porto, que com um pequeno gap temporal, entrou também na rota de investimento de quem tem liquidez para o fazer.
A pandemia, ao contrário do que muitos começaram por pensar, não fez abrandar o mercado imobiliário que, ao invés, manteve taxas de crescimento positivas, quer em número de transacções quer em preços por m2.
A trabalhar em casa, a necessidade de espaço – interior e exterior – agudizou-se e necessidades até então pouco evidentes, tornaram a troca de casa inevitável.
Ao mesmo tempo, as taxas de juro nulas não promovem a poupança e por isso o imobiliário mantém-se como activo de refúgio com rentabilidades interessantes.
2023 – o que esperar com níveis de inflação elevados e, por consequência, taxas de juro a disparar?
Se por um lado o serviço da dívida aumenta para quem contraiu um crédito habitação de taxa variável, a crise de 2008 serviu para dar algum tipo de lição aos bancos que por esta altura terão uma percentagem média muito inferior de LTV’s (Loan to Value, ou, doutra forma, valor do financiamento face ao valor de avaliação da casa) ao que teriam na crise de 2008. Por esta razão, acredito que menos famílias entrem em incumprimento, por um lado, e por outro, que os bancos lidem de forma muito diferente com os clientes que percebam necessitar de ajuda, renegociando o crédito, por exemplo, por extensão de prazo.
Do outro lado, continuamos a ter os investidores e, se em dado momento considerei existirem uma franja de investidores mais conservadores, que voltariam aos seus depósitos a prazo com a subida de taxas de juro, a verdade é que a injecção de dinheiro dos bancos centrais na economia durante a pandemia criou um excesso de liquidez que para além da inflação fez com que os bancos não sintam qualquer necessidade de atrair depósitos e por isso, não elevam as taxas de juro passivas. Ou seja, esta eventual franja de investidores continua a ter o imobiliário na mira como forma de diversificação de activos.
Da mesma forma, se por um lado o aumento das taxas de juro encarece os custos de financiamento de quem precisa de recorrer à banca para comprar casa – ao que acresce normalmente maior exigência por parte dos bancos nos rácios exigidos para cobertura do risco, por outro, há também uma clara escassez de oferta, o que reduz o espaço, o incentivo ou a motivação para a potencial queda de preços. Recordar que Portugal se mantém muito apelativo para os estrangeiros.
De facto, se em 2022 a procura pelas casas já superava a oferta, em 2023 é de crer que tal se mantenha mas que se assista, simultaneamente, a um deslocar da procura para zonas cada vez mais periféricas – até pela manutenção do teletrabalho, em formato total ou híbrido – por parte dos portugueses que veem o seu rendimento disponível diminuir.
Os principais beneficiados pelo contexto actual serão, inevitavelmente, os investidores estrangeiros, sobretudo os americanos e brasileiros mas também britânicos e franceses, que continuarão a procurar não só as boas oportunidades de negócios que surjam no segmento alto, mas, também, as vantagens oferecidas pelo país, nomeadamente: a segurança, o clima, a gastronomia e a facilidade de deslocação proporcionada pela localização privilegiada, servindo de ponte entre a América e a restante Europa.
Não obstante, a estimativa da Agência Moody’s por exemplo, para 2023, é de que o valor dos imóveis sinta uma correção em diversos países, dentre os quais: Alemanha, Estados Unidos e Reino Unido. Na perspetiva desta agência, o valor das casas em Portugal deverá manter-se estável no 1% ou descer até um máximo de 3%.
Com indicadores que podem ser considerados contraditórios, julgo que em 2023 deverá haver um abrandamento do crescimento observado nos últimos anos no que se refere ao número de transações imobiliárias e também ao preço por m2. Claro que a localização e segmento do imóvel criam patamares de evolução diferentes. E falando essencialmente de compra e venda, não nos podemos esquecer da forte relação entre o mercado de arrendamento e o de compra e venda, claro. Quanto mais elevadas forem as rendas – e sem dúvida que os chamados nómadas digitais têm aqui algum papel no valor dos arrendamentos – maior a atratividade do mercado imobiliário enquanto activo.
Artigo de opinião do Observador.pt
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